O STJ E O ADITAMENTO DO PEDIDO NA EXECUÇÃO

O STJ E O ADITAMENTO DO PEDIDO NA EXECUÇÃO

No julgamento do REsp 1.546.430/RS, relatado pelo ministro Gurgel de Faria, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, entendeu ser possível aditar o pedido no processo de execução, mesmo após a citação do executado.

O julgado foi assim ementado:

“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO CONTRA FAZENDA PÚBLICA. CITAÇÃO. ADITAMENTO DE PEDIDO. NOVA OPORTUNIDADE DE CONTRADITÓRIO. POSSIBILIDADE.

            1. O CPC/73 adotava como regra a impossibilidade de ampliação do pedido após a citação da parte contrária sem a anuência desta (art. 264).
            2. A limitação imposta pelo referido artigo dizia respeito à fase de conhecimento, tanto que inserida apenas no Livro I do Código, não havendo igual previsão na seção própria da fase de execução (Livro II).
            3. Justifica-se a existência do supracitado dispositivo no âmbito do conhecimento, pois é tal fase que está associada à incerteza do direito, pelo que nela é necessária a fixação de marcos legais para estabilização da lide, de sorte a se delimitar exatamente o que e quem será atingido pelos efeitos da decisão.
            4. Uma vez que o objetivo na fase de execução é a satisfação integral do título, já havendo a certeza do direito, nada impede que o pedido inaugural – inicialmente limitado a parcela da cobrança – seja posteriormente aditado para a perseguição da totalidade do crédito, desde que a pretensão não esteja fulminada pela prescrição e seja garantido à parte executada nova oportunidade de defesa.
            5. No caso, agiu com correção o juízo de origem ao permitir a ampliação do pedido, para inclusão de valores que não haviam sido cobrados desde o início da execução, oportunizando nova citação (art. 730 do CPC/73) da Fazenda Pública.
            6. Recurso especial não provido.”[1]

Como se pode perceber, o caso julgado pelo STJ invocava análise de dispositivos do CPC/1973: art. 264 e art. 730.

Tais dispositivos encontram semelhanças com as previsões do CPC/2015. O art. 730 do CPC/1973 tratava do cabimento de embargos na execução contra a Fazenda Pública. Há disposição semelhante no CPC/2015, em seu art. 535, que dispõe sobre o cabimento da impugnação ao cumprimento de sentença proferida em face da Fazenda Pública.

A regra que antes era fixada no art. 264 do CPC revogado agora consta de forma semelhante no art. 329 do CPC/2015. Senão veja-se:

CPC/1973, Art. 264. Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei.

Parágrafo único. A alteração do pedido ou da causa de pedir em nenhuma hipótese será permitida após o saneamento do processo.

CPC/2015, Art. 329. O autor poderá:

I – até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;

II – até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.

Nos dois códigos, como se vê, a regra da estabilização objetiva da demanda diz respeito ao processo de conhecimento. E há razões para tanto.

É importante que a demanda seja estabilizada no processo de conhecimento porque nele tem-se um estado de dúvida a respeito do direito que se está a discutir. Então, é necessário que se delimite o objeto da discussão, para que possam ser produzidas as provas necessárias para os esclarecimentos que couberem no caso.

Por isso é que o limite final para o aditamento do pedido ou da causa de pedir é o saneamento do processo, já que depois dele inicia-se a fase instrutória, que depende de se ter delimitado o objeto das provas.

Já na fase de cumprimento de sentença ou no processo executivo não se tem esse estado de dúvida que permeia o processo de conhecimento. Na execução já há certeza sobre o direito, até mesmo porque este é um dos requisitos do título executivo (CPC/2015, art. 783).

Forte nessas razões, o STJ entendeu não valer para a execução a regra da estabilização da demanda que opera efeitos no processo de conhecimento, a saber:

“Uma vez que o objetivo na fase de execução é a satisfação integral do título, já havendo a certeza do direito, nada impede que o pedido inaugural – inicialmente limitado a parcela da cobrança – seja posteriormente aditado para a perseguição da totalidade do crédito, desde que a pretensão não esteja fulminada pela prescrição e seja garantida à parte executada nova oportunidade de defesa.”[2]

Não tivesse sido esse o entendimento prevalecente, sendo inadmitida a complementação do pedido formulado na execução, caberia ao credor a propositura de novo processo executivo ou o requerimento de novo cumprimento de sentença, fundado no mesmo título já executado parcialmente em data pretérita. Isso porque se está a admitir aqui que o credor não tenha expressamente renunciado ao direito objeto do aditamento.

A propositura de nova execução ou a apresentação de novo pedido de cumprimento de sentença ocasionaria mais despesas processuais e feriria a regra da economia processual.

Já a admissão do aditamento implicaria tão somente na necessidade de nova citação (se fosse execução por título extrajudicial) ou de nova intimação (se se tratasse de cumprimento de sentença), a fim de que ao executado fosse dada a oportunidade de adimplir a obrigação na parte em que aditada ou de promover a sua defesa, caso entendesse pertinente.

Entendimento semelhante o STJ já havia firmado no julgamento do REsp n. 504.168/SE[3], em que se admitiu a possibilidade de a Fazenda Pública substituir a Certidão de Dívida Ativa enquanto não tenha sido prolatada a sentença nos Embargos à Execução, com base na previsão da Lei de Execução Fiscal, em seu art.  2º, § 8º, que prevê, inclusive, a reabertura de prazo para novos embargos.

Nesse sentido, alinha-se a jurisprudência do STJ à legislação que dá à Fazenda Pública a prerrogativa de aditar o objeto da demanda executiva, conferindo essa prerrogativa para qualquer exequente, não apenas para o Estado cobrador de tributos.

Evidentemente, o aditamento do pedido na fase ou no processo executivo impõe a comunicação processual adequada ao executado, com a reabertura do prazo para que exerça o seu direito de defesa.

[1] BRASIL, STJ, REsp 1.546.430/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, j. em 24/08/2021, DJe 20/09/2021.

[2] BRASIL, STJ, REsp 1.546.430/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, j. em 24/08/2021, DJe 20/09/2021.

[3] BRASIL, STJ. REsp n. 504.168/SE, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Neto, j. em 18/08/2003, DJ 28/10/2003.

Autor

  • Professor do Departamento de Direito Processual da UEPG; Coordenador do grupo de pesquisa Observatório Processual do STJ na UEPG; Doutorando em Direito pela UFPR; Mestre em Ciência Jurídica pela UENP; Autor dos Comentários ao Código de Processo Civil pela Editora Juruá; Advogado.

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